
I
Há muitos anos eu vivo aqui, pacífico num ninho, um lar meu, um gesto teu, um olhar todo nosso.
Eu tenho germinado em tua terra, sentido o teu gosto, alisado seu rosto, encostado em teus pés.
II
Eu quis ter-te entre os seios para proteger-te, arranhar-te em ombros meus para juntar-te entre meu teto;
porém, tuas pernas te levaram para mais longe a sentir outros ventos, a encontrar antigo pouso.
III
Estive aqui em tua guarda para pregar-te em meu peito e jamais esquercer a superfície de tua asa
que brincou comigo feito casa e fez de tu minha nova morada.
Valente fui ao te deixar, levando comigo apenas os tons pastéis, o teu solar, nossos anéis;
embora contigo eu tenha me entregado e dilacerado minha memória,
enxuguei todo o meu cansaço debaixo de teu telhado que até agora me acomoda.
IV
Porque tu foi pra mim um intruso antes nunca envolvido, um querido hóspede a perigo
a caminhar entre minhas paredes transformando o féu em aroma ardente, textura quente
tornando-me seu abrigo entre os dias, dando meus perecíveis a um estranho ser
não sendo o mais astuto presente, fez eterno e distante aquele último entardecer
V
E tu que foi grama para o meu jardim trazendo uma boa colheita dentro de mim
substanciou e fez crescer o fruto em árvore antes já minha e me fez escolher a vida onde plantar
Vou querer pra sempre o teu sal, tua porta a me abrigar, teu café a me acolher, tua rede acalantar
pra depois de um qualquer de boa noite, ter um som teu em meu ouvido, para ter o que lembrar